quinta-feira, 6 de abril de 2023

Limbo previdenciário

O limbo previdenciário é uma situação que pode ocorrer quando o trabalhador é afastado do trabalho por motivos de saúde e seu benefício previdenciário é negado pelo INSS. Essa negativa pode ocorrer por diversas razões, como falta de documentos médicos, ausência de comprovação de incapacidade ou outros motivos.

De acordo com a legislação brasileira, o trabalhador que se encontra em situação de limbo previdenciário tem direito a receber o salário do empregador pelo período em que estiver afastado do trabalho, até que seja concedido o benefício previdenciário pelo INSS. Essa obrigação do empregador está prevista no art. 60 da Lei 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social:

"Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.

(…)

§ 5º Quando o auxílio-doença for devido por acidente do trabalho, o empregador será responsável pelo pagamento do salário do segurado durante os primeiros quinze dias consecutivos ao do afastamento da atividade, cabendo ao INSS tão-somente o pagamento do benefício a partir do décimo sexto dia de afastamento, salvo se constatada incapacidade que exija afastamento por mais de quinze dias."

Ou seja, nos casos em que o trabalhador é afastado por motivo de acidente de trabalho, o empregador é responsável pelo pagamento do salário nos primeiros 15 dias de afastamento, e somente após esse período é que o INSS passa a pagar o benefício previdenciário.

No entanto, nos casos em que o afastamento é motivado por doença comum ou acidente não relacionado ao trabalho, o empregador não é obrigado a pagar o salário nos primeiros 15 dias de afastamento, cabendo ao trabalhador aguardar a concessão do benefício previdenciário pelo INSS. É nesse momento que ocorre o limbo previdenciário, já que o trabalhador fica sem receber salário do empregador e sem receber o benefício do INSS.

Para solucionar essa situação, a jurisprudência tem se manifestado no sentido de que o empregador deve arcar com o pagamento do salário do trabalhador durante todo o período em que o benefício previdenciário estiver em análise pelo INSS, ou seja, até que seja concedido ou negado o benefício. Essa posição tem sido adotada pelos tribunais em diversos casos, como se pode observar nos seguintes julgados:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. LIMBO PREVIDENCIÁRIO. AFASTAMENTO POR MOTIVO DE SAÚDE. PREVISÃO LEGAL. ARTIGO 60, § 5º, DA LEI Nº 8.213/91. OBRIGAÇÃO DO EMPREGADOR DE PAGAMENTO DO SALÁRIO DO TRABALHADOR DURANTE OS PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AFASTAMENTO. EXTENSÃO DA OBRIGAÇÃO DO EMPREGADOR ATÉ A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO PELO INSS. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. 1. O limbo previdenciário é a situação em que o trabalhador, afastado do trabalho por motivo de saúde, não recebe salário do empregador nem benefício previdenciário do INSS. 2. Nos termos do artigo 60, § 5º, da Lei nº 8.213/91, o empregador é obrigado a pagar o salário do trabalhador durante os primeiros quinze dias de afastamento em decorrência de acidente do trabalho. 3. A jurisprudência tem entendido que, mesmo nas hipóteses em que o afastamento é motivado por doença comum ou acidente não relacionado ao trabalho, o empregador deve arcar com o pagamento do salário do trabalhador até a concessão ou negativa do benefício previdenciário pelo INSS. 4. Precedentes deste Tribunal Regional do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho. 5. Decisão mantida. Recurso improvido" (TRT-3 - RO: 00111597220165030028, Relator: Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto, Terceira Turma, Data de Publicação: 11/04/2018)

Nesse sentido, a jurisprudência tem entendido que a obrigação do empregador de pagar o salário do trabalhador se estende até a concessão ou negativa do benefício previdenciário pelo INSS, mesmo nos casos em que o afastamento não é motivado por acidente de trabalho. Essa posição é respaldada pelo art. 60, § 5º, da Lei 8.213/91 e pelos princípios da proteção ao trabalhador e da solidariedade social, que fundamentam o sistema previdenciário brasileiro.

Em conclusão, o limbo previdenciário é uma situação que pode ocorrer quando o trabalhador é afastado do trabalho por motivo de saúde e o benefício previdenciário é negado pelo INSS. Nos casos em que o afastamento é motivado por acidente de trabalho, o empregador é obrigado a pagar o salário nos primeiros 15 dias de afastamento, e somente após esse período é que o INSS passa a pagar o benefício. Nos demais casos, o empregador não é obrigado a pagar o salário nos primeiros 15 dias de afastamento, mas a jurisprudência tem entendido que a obrigação do empregador se estende até a concessão ou negativa do benefício previdenciário pelo INSS. Essa posição é fundamentada pelo art. 60, § 5º, da Lei 8.213/91 e pelos princípios da proteção ao trabalhador e da solidariedade social.

terça-feira, 4 de abril de 2023

Avanço prático na Perspectiva de Gênero

O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero é uma ferramenta que tem como objetivo orientar e capacitar magistrados e magistradas a aplicarem a perspectiva de gênero em suas decisões judiciais, de forma a promover a igualdade de gênero e combater a discriminação e a violência contra as mulheres.

O Protocolo foi elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com diversas entidades da sociedade civil e foi lançado em 2018. Ele foi atualizado em 2021 para incluir novas orientações e recomendações.

O Protocolo é dividido em cinco etapas: sensibilização, análise de dados, interpretação das normas, produção da decisão e acompanhamento da decisão. Em cada etapa, são apresentadas orientações e exemplos práticos de como aplicar a perspectiva de gênero.

Na etapa de sensibilização, por exemplo, são apresentadas informações sobre as desigualdades de gênero existentes na sociedade e a importância de se combater a violência contra as mulheres. Já na etapa de análise de dados, são apresentados dados e estatísticas sobre violência doméstica, feminicídio e outros temas relacionados à igualdade de gênero.

Na etapa de interpretação das normas, o Protocolo recomenda que sejam levadas em conta as convenções internacionais de direitos humanos ratificadas pelo Brasil, como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará).

Na produção da decisão, o Protocolo recomenda que sejam evitados estereótipos de gênero e que sejam levados em conta os impactos da decisão sobre homens e mulheres de forma equitativa. Já na etapa de acompanhamento da decisão, o Protocolo recomenda que seja feita uma avaliação periódica dos resultados da decisão, a fim de verificar se ela contribuiu para a promoção da igualdade de gênero.

O Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero é uma importante ferramenta para garantir que a igualdade de gênero seja levada em conta no exercício da função judiciária. Ele contribui para o fortalecimento da democracia e para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Referências:

Conselho Nacional de Justiça. Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero: orientações para o julgamento com igualdade de gênero. Brasília, CNJ, 2018.

Conselho Nacional de Justiça. Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero: orientações para o julgamento com igualdade de gênero (Atualização 2021). Brasília, CNJ, 2021.

Governo institui importante meida contra o Assedio Sexual


A Lei nº 14.540/2022, aprovada em 3 de abril de 2022, instituiu o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais crimes contra a Dignidade Sexual no âmbito das instituições de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica. Essa lei é um marco importante na luta contra o assédio sexual e outros crimes contra a dignidade sexual no ambiente acadêmico, ao estabelecer diretrizes para a prevenção e combate a esses problemas.


A Lei nº 14.540/2022 tem como objetivo principal prevenir e combater o assédio sexual e outros crimes contra a dignidade sexual nas instituições de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica. Para isso, a lei estabelece uma série de medidas que devem ser adotadas pelas instituições, como a criação de comissões de prevenção e enfrentamento ao assédio sexual e demais crimes contra a dignidade sexual, a elaboração de políticas de prevenção e enfrentamento desses crimes, a realização de campanhas de conscientização e a promoção de treinamentos para a comunidade acadêmica sobre o tema.

Além disso, a lei determina que as instituições devem disponibilizar canais de denúncia de assédio sexual e outros crimes contra a dignidade sexual, que garantam a privacidade e a segurança das vítimas e testemunhas, bem como o acompanhamento psicológico e jurídico das vítimas. As denúncias devem ser investigadas com rigor e imparcialidade, garantindo o direito ao contraditório e à ampla defesa.

A Lei nº 14.540/2022 também prevê a obrigatoriedade de inclusão de conteúdos relacionados à prevenção e combate ao assédio sexual e outros crimes contra a dignidade sexual nos currículos dos cursos de graduação e pós-graduação das instituições de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica.



A Lei nº 14.540/2022 é uma importante iniciativa na luta contra o assédio sexual e outros crimes contra a dignidade sexual no ambiente acadêmico. Ao estabelecer diretrizes para a prevenção e combate a esses problemas, a lei busca garantir um ambiente acadêmico seguro e respeitoso para todos os estudantes, professores e pesquisadores. É importante que as instituições de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica cumpram as medidas estabelecidas pela lei e promovam a conscientização sobre o tema, a fim de prevenir e combater o assédio sexual e outros crimes contra a dignidade sexual.

Quais doenças permitem a Isenção do Imposto de Renda em 2023

Existem algumas doenças graves que podem dar direito à isenção do Imposto de Renda em 2023. São elas:

AIDS (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida)
Alienação Mental
Cardiopatia Grave
Cegueira (inclusive monocular)
Contaminação por radiação
Doença de Paget em estados avançados (Osteíte Deformante)
Doença de Parkinson
Esclerose Múltipla
Espondiloartrose Anquilosante
Fibrose Cística (Mucoviscidose)
Hanseníase
Nefropatia Grave
Hepatopatia Grave
Neoplasia Maligna (Câncer)
Paralisia Irreversível e Incapacitante
Tuberculose Ativa.
Para ter direito à isenção do Imposto de Renda, é necessário que o contribuinte apresente laudo pericial emitido por serviço médico oficial da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios que comprove a moléstia grave.

Vale ressaltar que a isenção do Imposto de Renda não é automática e o contribuinte deve solicitar a isenção ao informar os rendimentos na declaração anual de imposto de renda ou mediante processo administrativo ou judicial.

A regulamentação das doenças que permitem a isenção do Imposto de Renda está prevista na Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988. Essa lei estabelece as regras para a isenção do imposto de renda para pessoas portadoras de algumas doenças graves.

Além disso, a Receita Federal do Brasil publica anualmente uma Instrução Normativa com as regras e procedimentos para a declaração do Imposto de Renda. Nessa instrução, são detalhadas as condições para a concessão da isenção do imposto de renda, incluindo a lista de doenças que dão direito à isenção e os documentos necessários para comprovação da moléstia grave.

Dessa forma, a regulamentação das doenças que permitem a isenção do Imposto de Renda está prevista em lei, mas as regras e procedimentos específicos podem ser encontrados nas instruções normativas publicadas pela Receita Federal.

Existe isenção para doenças reumatológicas?

Sim, algumas doenças reumatológicas graves podem dar direito à isenção do Imposto de Renda. A espondiloartrose anquilosante é uma delas, conforme previsto na lista de doenças graves estabelecida pela Lei nº 7.713/1988.

Além disso, outras doenças reumatológicas, como a artrite reumatoide e o lúpus eritematoso sistêmico, podem ser consideradas como doenças graves, dependendo do grau de comprometimento e do estágio da doença. Nesses casos, o contribuinte deve comprovar a gravidade da doença por meio de laudo pericial emitido por serviço médico oficial da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios. 

É importante lembrar que a isenção do Imposto de Renda para pessoas portadoras de doenças graves não é automática e deve ser solicitada pelo contribuinte. Para isso, é necessário preencher os requisitos estabelecidos pela legislação e apresentar os documentos necessários à comprovação da moléstia grave. A lista de doenças que dão direito à isenção do Imposto de Renda pode ser consultada na Lei nº 7.713/1988 e na IN RFB nº 2.010/2021 da Receita Federal.
Assim você deve fazer seu pedido de isenção de maneira administrativa, caso seja negado pode ser ingressado com ação judicial.

Caso você esteja em dúvida por entrar em contato.

O que fazer em caso de perda da Carteira de Trabalho?

Existem algumas formas de comprovar o tempo de trabalho para o INSS sem a carteira de trabalho, são elas:

Extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS): é possível obter esse extrato pelo site do Meu INSS ou em uma agência da Previdência Social. Ele apresenta o registro de todas as contribuições feitas ao INSS e o tempo de trabalho registrado em cada uma delas.

Declaração do empregador: o empregador pode fazer uma declaração reconhecida em cartório, informando o período em que você trabalhou na empresa, a função exercida e o salário recebido. É importante ressaltar que o empregador não é obrigado a fornecer essa declaração.

Prova testemunhal: caso não seja possível conseguir os documentos anteriores, é possível buscar testemunhas que possam confirmar o período em que você trabalhou em determinada empresa e a função exercida.

Documentos fiscais: notas fiscais, recibos e contratos de prestação de serviços também podem ser utilizados como prova do tempo de trabalho.

É importante lembrar que quanto mais documentos e provas você tiver, maior será a chance de comprovar o tempo de trabalho para o INSS. Além disso, o processo pode ser mais complexo e demorado sem a carteira de trabalho, por isso é importante buscar a orientação de um advogado ou procurar ajuda em uma agência da Previdência Social.

O que fazer em caso do empregador não ter recolhido as contribuições ao INSS para se aposentar?

Se o empregado não teve suas contribuições ao INSS reconhecidas, pode ser necessário entrar com um processo administrativo ou judicial para buscar a correção dessa situação.

A primeira medida é verificar se as contribuições estão registradas no CNIS, que é o Cadastro Nacional de Informações Sociais. Caso as informações estejam incompletas ou incorretas, é possível solicitar uma revisão administrativa junto à Previdência Social.

Caso a revisão administrativa não seja suficiente para corrigir a situação, é possível entrar com uma ação judicial para buscar o reconhecimento das contribuições e garantir o direito à aposentadoria. Para isso, é importante contar com a assessoria de um advogado especializado em Direito Previdenciário.

Outra opção é procurar os sindicatos da categoria profissional ou associações de aposentados e pensionistas, que podem oferecer assistência jurídica gratuita ou a preços acessíveis.

É importante lembrar que o tempo de contribuição é um dos requisitos para a concessão de aposentadoria, e sem o reconhecimento das contribuições, o trabalhador pode não ter direito ao benefício. Por isso, é fundamental manter os documentos que comprovem as contribuições feitas ao INSS e buscar ajuda especializada em caso de dúvidas ou problemas.

segunda-feira, 3 de abril de 2023

O que é o BPC?

BPC (Benefício de Prestação Continuada) é um benefício assistencial previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), regulamentado pela Lei nº 8.742/93, que garante um salário mínimo mensal para pessoas idosas com 65 anos ou mais ou para pessoas com deficiência, de qualquer idade, que comprovem não possuir meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.

O BPC é um benefício de caráter assistencial, ou seja, não exige contribuição prévia para a sua concessão e é financiado pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS).

Para ter direito ao BPC, é necessário que o beneficiário comprove que possui renda mensal per capita (por pessoa) inferior a 1/4 do salário mínimo. Além disso, é necessário que a pessoa comprove sua deficiência, quando for o caso, e que esteja inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).

O BPC não gera direito a 13º salário e não é hereditário. O benefício pode ser revisto a qualquer momento pelo INSS, que poderá cessá-lo se o beneficiário deixar de preencher os requisitos para a concessão.

segunda-feira, 27 de março de 2023

OCUPAÇÃO NÃO É INVASÃO

- Carol Proner

Estimados amigos e amigas do MST

 

A propósito dos ataques que a imprensa burguesa vem fazendo contra o MST,  devido a ocorrência de ocupações  legitimas e necessárias, compartilhamos o artigo da jurista e professora da UFRJ,  Carol Proner.

 

Agradecemos se nos ajudarem a difundir!

 

Saudações

Secretaria Geral

 

 

OCUPAÇÃO NÃO É INVASÃO 

 

Carol Proner - UFRJ/ABJD/Grupo Prerrogativas 

 

Para tratar de tema tão sensível, e em homenagem às crianças que vivem em acampamentos e assentamentos por todo o país e que lutam, junto de suas famílias, pela terra e por condições dignas de vida e de trabalho, em homenagem às mulheres do campo e o direito a semear, plantar, colher e produzir, em homenagem aos homens camponeses do Brasil e sua força de trabalho em prol de uma sociedade livre da miséria e da fome e em direção à agroecologia, façamos um trato contra a ignorância e a estupidez em matéria de direito à terra.

 

Ocupação não é o mesmo que invasão. A Constituição Federal de 1988 define o conceito de uso social da terra e os critérios para que seja legítimo, que não degrade o meio ambiente, que não se faça por meio de trabalho escravo ou análogo e que seja produtiva. A ocupação de terras tem sido historicamente a forma pela qual os movimentos camponeses chamam a atenção para este compromisso de direitos fundamentais e da necessidade de que a propriedade venha acompanhada de uma função social. Confundir os dois conceitos propositalmente é uma forma de negar a luta pela terra e os legítimos sujeitos de direito, assim reconhecidos pela Declaração da ONU sobre Direitos dos Camponeses.

 

A ocupação pode ser uma forma legítima de fazer pressão e chamar atenção para o descaso com a Reforma Agrária. As ocupações que aconteceram no sul da Bahia, nas terras da Suzano, maior empresa de celulose do mundo, trouxe ao conhecimento da sociedade um acordo descumprido desde 2011 entre a empresa e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), termo mediado pelo INCRA e que afeta direitos de 750 famílias que aguardam há 12 anos pela cessão das terras. Trazer luz para o caso concreto e também para a desativação das instituições de regulamentação fundiária é parte do papel das ocupações.

 

As ocupações podem ser uma forma legítima de rediscutir o sentido social da terra. Também o caso da Suzano, já em processo de renegociação, revela aspectos da produtividade da monocultura que devem ser objeto de rediscussão pela sociedade brasileira e pelos órgãos de controle e financiamento público. É o caso da monocultura do eucalipto, cultivo incrementado com o uso de agrotóxicos aplicados inclusive por meio da pulverização aérea, o que gera efeitos indiscriminados de envenenamento.

 

Eis a razão pela qual florestas de eucalipto são chamadas ?desertos verdes?. Essa foi uma expressão que surgiu no debate a respeito da legitimidade das ocupações. Para que o eucalipto prospere, a mata nativa precisa sair do lugar, acarretando produção de uma só cultura utilizada para desenvolver a indústria moveleira e de celulose. Só a empresa Suzano cultiva 3 milhões de hectares de eucalipto, o que forçosamente acarreta brusca redução da biodiversidade no território do sul da Bahia. Ao mesmo tempo, a cadeia de fauna e flora fica reduzida a uma única espécie exógena, uma vez que o eucalipto não é arvore nativa brasileira e, para agravar o problema específico do agronegócio associado à indústria de celulose, tanto a forma de cultivo como as substâncias utilizadas para intensificar a produção desgastam o solo e comprometem a recuperação de futuras florestas nativas. Existem soluções para aplacar efeitos nocivos, saídas da ciência e da tecnologia, mas diante dos efeitos devastadores e da imposição acrítica do agronegócio como única saída econômica, as ocupações de luta pela terra cumprem o papel de denunciar e despertar a reflexão da sociedade a respeito dos meios e métodos produtivos predominantes incentivados (por renuncias fiscais ou financiamento) diante da realidade de 33 milhões de pessoas que passam fome no Brasil.

 

Em meio ao debate, cresce o entendimento do que seja Reforma Agrária Agroecológica. Os movimentos pela terra, o MST em particular, têm defendido que a luta histórica pela Reforma Agrária seja substituída pela Reforma Agrária Agroecológica, compreendida nas dimensões da produção do alimento saudável e sustentável para toda a sociedade brasileira, isso em contraposição ao agronegócio. O debate inclui, além do acesso à terra como um direito humano, também a produção de alimentos salubres e livres de agrotóxicos, a defesa das formas de vida e trabalho no campo, o papel da mulher camponesa, a forma de organização em cooperativas da agroecologia, a riqueza da (bio)diversidade alimentar, a soberania alimentar, o combate à fome e tantos outros conceitos e efeitos de um debate responsável e consequente.

 

O que esperar do temido Abril Vermelho? É notável a desinformação provocada por setores da imprensa e meios especializados que repercutem intolerância e preconceito contra camponeses e suas lutas. Mesmo involuntariamente, a desinformação estimula promessas de violência, atos potencialmente criminosos cogitados por fazendeiros com respeito ao uso de armas de fogo contra militantes.

 

No histórico mês de mobilização pela Reforma Agrária, conhecido como Abril Vermelho em memória do Massacre de Eldorado dos Carajás, o MST atualiza as pautas de luta em 2023: repúdio aos agrotóxicos, fim do desmatamento, oposição à aprovação do novo Código Florestal em trâmite na Câmara dos Deputados e reconstituição dos canais estatais (Incra e outros) para finalmente viabilizar o assentamento de mais de 100 mil famílias que aguardam pelo acesso à terra.

 

Conhecer o contexto dos enfrentamento e das ocupações é condição elementar de respeito à luta dos trabalhadores rurais do país, além de ser um dever legal e uma oportunidade de estimular a produção de alimentos saudáveis como alternativa ao envenenamento cotidiano ao qual estamos submetidos.

 

 

*Carol Proner é Doutora em Direito, Membro da ABJD e do Grupo Prerrogativas.

STJ, Canabidiol e o Direito à Saúde: quando a letra fria da lei congela vidas quentes

 A recente decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negando a obrigatoriedade de cobertura pelas operadoras de plano...