segunda-feira, 30 de junho de 2025

Porque todos os militantes da saúde devem se somar ao plebiscito popular.


O Plebiscito Popular 2025 representa uma importante iniciativa de democracia participativa no Brasil, organizada por movimentos sociais, centrais sindicais, partidos progressistas e organizações da sociedade civil.

Esta consulta popular mesmo que seja  vinculante, isso é, seu resultado obrigatório para o governo,  busca mobilizar a opinião pública sobre duas questões fundamentais que impactam diretamente a saúde e qualidade de vida dos trabalhadores brasileiros.


Vamos lá: O que é o Plebiscito Popular 2025


O plebiscito é uma consulta pública voluntária que será realizada entre 01 de julho e 07 de setembro de 2025, permitindo que os brasileiros votem sobre questões centrais para o futuro do país. A votação ocorrerá tanto em urnas físicas instaladas em sindicatos, praças, igrejas, terminais de transporte e locais de trabalho, quanto pela internet através do site www.plebiscitopopular.org.br.

As Duas Principais Pautas

1. Redução da Jornada de Trabalho e Fim da Escala 6x1

A primeira questão aborda a redução da jornada de trabalho sem corte salarial e o fim da escala 6x1 (seis dias trabalhados para um de descanso). Atualmente, o Brasil mantém uma jornada máxima de 44 horas semanais, uma das maiores do mundo. A proposta visa reduzir 40 horas e posteriormente para 36 horas semanais, garantindo mais qualidade de vida aos trabalhadores.

2. Reforma Tributária Progressiva

A segunda questão propõe a isenção total do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais e a taxação progressiva para quem recebe acima de R$ 50 mil por mês. Esta medida busca promover justiça fiscal, aliviando a carga tributária sobre os mais pobres enquanto aumenta a contribuição dos mais ricos.

A Redução da Jornada como Questão de Saúde Pública

Impactos na Saúde Física e Mental

A redução da jornada de trabalho representa uma medida preventiva fundamental para a saúde coletiva. Cirlene Zimmermann, procuradora do Ministério Público do Trabalho, destacou a associação direta entre longas horas de trabalho e doenças físicas e mentais, além de acidentes laborais. Das 20 ocupações com mais acidentes, 12 estão entre as que exigem maior carga horária.

Dados Alarmantes sobre Acidentes de Trabalho

Leonardo Landulfo, da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, revelou que o Brasil registrou em 2024 mais de 740 mil acidentes de trabalho e 2,5 mil mortes. Isso significa que a cada três horas e meia, um trabalhador morre em decorrência de acidente. Estes números demonstram que a redução da jornada é uma medida de proteção coletiva urgente.

Benefícios para a Saúde dos Trabalhadores

A redução da carga horária traz impactos diretos e positivos para a saúde:

Diminuição do estresse e melhoria da saúde mental

Redução de doenças físicas relacionadas ao trabalho excessivo

Mais tempo para recuperação e descanso adequado

Prevenção de acidentes causados por fadiga e sobrecarga

Melhoria da qualidade do sono e dos hábitos alimentares


Argumentos de Saúde Pública para os Militantes

A Jornada Excessiva como Determinante Social da Saúde


Para os militantes da saúde, é fundamental compreender que a jornada de trabalho excessiva constitui um determinante social da saúde. O tempo excessivo dedicado ao trabalho compromete:

Acesso aos serviços de saúde (falta de tempo para consultas e exames)

Práticas de autocuidado (exercícios físicos, alimentação adequada)

Saúde mental (isolamento social, depressão, ansiedade)

Saúde familiar (impacto nas relações familiares e cuidado com filhos)


Impacto Desproporcional nas Mulheres


Adriana Marcolino, do Dieese, destacou que a redistribuição do tempo de trabalho pode beneficiar especialmente as mulheres, que ainda acumulam responsabilidades domésticas. A redução da jornada representa uma questão de equidade de gênero e saúde da mulher trabalhadora.

Geração de Empregos e Redução do Desemprego

A redução da jornada também representa uma estratégia de saúde coletiva ao combater o desemprego. Estimativas do Dieese preveem a criação de 3 milhões de novos empregos somente com a redução para 40 horas semanais. O desemprego é reconhecidamente um fator de risco para diversos problemas de saúde mental e física.

A Reforma Tributária e o Acesso à Saúde

Impacto da Isenção do IR até R$ 5 mil

A proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais representa um alívio financeiro significativo para 65% dos declarantes. Para uma família que ganha R$ 5 mil, isso significa uma economia anual de R$ 4.356,89, recursos que podem ser direcionados para:

Alimentação mais saudável

Atividades físicas e lazer

Qualidade de vida

Financiamento do Sistema de Saúde

A taxação progressiva dos mais ricos, com alíquotas de até 10% para quem ganha acima de R$ 50 mil mensais, pode gerar recursos adicionais para o financiamento do SUS e políticas públicas de saúde.

Mobilização e Perspectivas

O plebiscito representa uma oportunidade histórica para que os profissionais de saúde se posicionem como defensores não apenas da assistência médica, mas também da promoção da saúde através de mudanças estruturais na organização do trabalho e na distribuição de renda.

A campanha, que já mobiliza diversas capitais do país, conta com o apoio de centrais sindicais, movimentos sociais e partidos progressistas, demonstrando a amplitude do apoio popular a essas propostas. Para os militantes da saúde, esta é uma oportunidade de articular a luta por melhores condições de trabalho com a defesa da saúde como direito universal e bem comum.

O período de votação, entre 01/07 e 07/09, será precedido por uma intensa campanha de mobilização que começou em junho, oferecendo múltiplas oportunidades para que os profissionais de saúde se engajem na defesa dessas propostas como questões fundamentais de saúde pública. 

 

O EQUIVOCO DO DECRETO Nº 12.534/2025: UM RETROCESSO NA PROTEÇÃO SOCIAL DOS MAIS VULNERÁVEIS

 


O Decreto nº 12.534, de 25 de junho de 2025, recentemente editado pelo Governo Federal, promoveu alterações relevantes nas normas de concessão e manutenção do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS). Embora traga avanços pontuais, como a ampliação de algumas exclusões no cálculo da renda familiar, o decreto incorre em grave equívoco ao reincluir os valores oriundos do Programa Bolsa Família na composição da renda familiar per capita, o que representa uma afronta à lógica constitucional da assistência social como direito fundamental autônomo e não contributivo, com consequências práticas de exclusão de milhares de beneficiários em situação de extrema vulnerabilidade.

1. Violação ao Princípio da Proteção Integral e à Finalidade da Assistência Social

Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal, a assistência social deve ser prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição. O Benefício de Prestação Continuada (BPC) é expressão direta desse mandamento constitucional, destinado a garantir mínimos existenciais para idosos e pessoas com deficiência em situação de pobreza extrema. A inclusão do valor do Bolsa Família – que também se destina a mitigar vulnerabilidades socioeconômicas – no cálculo da renda familiar viola a natureza complementar e cumulativa dos programas assistenciais, prejudicando justamente os que mais precisam de suporte do Estado.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já consolidou entendimento nesse sentido. O REsp 1.112.557/MG (Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho) fixou que rendas de caráter alimentar e assistencial, como o Bolsa Família, não devem ser computadas na aferição da renda familiar para fins de BPC, justamente para não esvaziar a efetividade da proteção social constitucionalmente assegurada.

2. Risco de Exclusão e Agravamento da Pobreza

O efeito imediato da reinclusão do Bolsa Família como componente da renda familiar é o afastamento automático de famílias do direito ao BPC, mesmo quando estas permaneçam em situação de miséria. Trata-se de uma medida regressiva, incompatível com o princípio da proibição do retrocesso social, cuja aplicação é corolário da cláusula do Estado Democrático de Direito e da eficácia dos direitos sociais fundamentais, como já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (ADPF 347/DF, Rel. Min. Marco Aurélio).

A análise técnica evidencia o impacto: com mais de 6,2 milhões de beneficiários em 2025 e projeções de ampliação para 14,1 milhões até 2060, a modificação imposta pelo Decreto nº 12.534/2025 poderá interromper a trajetória ascendente de cobertura da política de assistência social, excluindo pessoas que dependem exclusivamente do BPC e do Bolsa Família para sobreviver.

3. Insegurança Jurídica e Inconstitucionalidade Material

A revogação do §2º, inciso II, do art. 4º do Decreto nº 6.214/2007 – que explicitava a exclusão do Bolsa Família do cômputo da renda familiar – não apenas contraria o entendimento jurisprudencial e doutrinário consolidado, como afronta os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da vedação à proteção insuficiente.

Além disso, ao alterar de maneira substancial os critérios para elegibilidade do BPC por meio de decreto presidencial, o Poder Executivo avança sobre competência legislativa do Congresso Nacional, o que pode configurar usurpação de competência, nos termos do art. 48 da Constituição Federal. A matéria, por tratar de direitos sociais de prestação positiva, demanda edição de lei em sentido formal, sob pena de inconstitucionalidade material e formal do novo decreto.

4. Inversão da Lógica da Proteção Social

Ao vincular dois benefícios assistenciais – Bolsa Família e BPC – como se fossem mutuamente excludentes, o decreto subverte a lógica da proteção social. Ambos os programas têm funções distintas, ainda que complementares, e não devem se anular mutuamente. O Bolsa Família visa combater a pobreza por meio da transferência de renda condicionada a ações em educação e saúde; o BPC, por sua vez, é um direito constitucional de prestação continuada e incondicional a pessoas em condições de hipervulnerabilidade.

Permitir que o valor de um benefício assistencial (Bolsa Família) sirva de base para negar o acesso a outro direito (BPC) é inverter a lógica do Estado Social e operar um mecanismo de exclusão disfarçado de critério de elegibilidade.

5. Impactos Discriminatórios e Desproporcionais

A medida impacta de forma desproporcional pessoas com deficiência e idosos em situação de miserabilidade – grupos protegidos por tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil, como a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (Decreto nº 6.949/2009), que possui status de emenda constitucional (nos termos do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal). A interpretação da legislação infraconstitucional, portanto, deve ser compatível com os tratados internacionais, sob pena de configurar violação de compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro.

É Necessário Revogar ou Reformular o Decreto

Diante de todo o exposto, é possível concluir que o Decreto nº 12.534/2025 incorre em erro jurídico, político e social. Ao tornar mais restritivos os critérios de acesso ao BPC com base em parâmetros que desconsideram a natureza assistencial do Bolsa Família, o governo compromete a eficácia do direito à assistência social, promovendo exclusão disfarçada de racionalidade fiscal.

Ainda que a medida tenha sido justificada sob o argumento de contenção de gastos, é imprescindível lembrar que os direitos sociais não podem ser sacrificados no altar do ajuste fiscal. O BPC é um instrumento constitucional de justiça social, e não um privilégio assistencial. O governo, portanto, deve rever com urgência a redação do decreto, restabelecendo a exclusão do Bolsa Família da base de cálculo da renda familiar e reafirmando o compromisso do Estado com os valores constitucionais da solidariedade, proteção à dignidade humana e justiça social.

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